sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Um caso de amor que se acabou

 "Em um país extremamente polarizado, Obama foi capaz de operar entre os extremos, ainda que, para isso, tenha desapontado a muitos"
"Como primeiro biógrafo de Obama, devo dizer que foi uma experiência curiosa ver seus altos e baixos perante a opinião pública. Tantos americanos se apaixonaram por Obama como uma versão idealizada daquilo que eles queriam em seu presidente! Por isso, naturalmente, muitos se desapontaram com seu desempenho na Presidência. Para mim, porém, Obama sempre foi muito linear. Enquanto ele subia e descia nas pesquisas, eu via o mesmo homem que encontrei há anos. Um político idealista, mas excessivamente pragmático, com enormes ambições de carreira e o desejo de tomar a decisão certa.
Comecei meu livro perguntando se os americanos endossariam Obama como candidato a presidente e é claro que a resposta foi "sim". Eu continuaria o livro com um relato detalhado de como ele conquistou a Presidência, numa campanha magistral orquestrada por David Axelrod e Robert Gibbs, entre outros.
Sobre o primeiro mandato, o que mais me chama a atenção é que o caso de amor entre Obama e muitos eleitores democratas e independentes acabou. Alguns dos traços de caráter de Obama, sobre os quais falei no meu livro, como sua natureza cautelosa, seu esforço para evitar conflitos, seu desejo de negociar com adversários, sua disposição para aceitar soluções parciais, deixaram um gosto amargo na boca dos liberais, que viam nele o esperado salvador das causas à esquerda.
Mas a verdade é que, mais cedo ou mais tarde, a queda de sua imagem, do ícone ao humano mortal, teria de acontecer. Obama foi tão competente para se vender como um semideus, que não seria possível a um homem de carne e osso corresponder a expectativas tão altas.
Conhecendo as origens políticas de Obama em Chicago e tendo coberto sua campanha para o Senado em 2004, talvez eu seja uma das pessoas menos surpresas com seu comportamento como presidente. Ainda vejo o mesmo homem que segui como repórter. Nas incontáveis entrevistas que fiz, antes de ele se tornar presidente, ficou bem claro que não se tratava de um esquerdista fanático, como dizia a direita, nem um salvador da pátria das causas liberais.
Ele era muito mais um político "mainstream", disposto a fechar acordos e não perturbar demais a ordem estabelecida. Por isso, imaginei que governaria para o centro do espectro político. E foi o que ele fez. Ou seja, em um país extremamente polarizado, Obama foi capaz de operar entre os extremos, ainda que, para isso, tenha desapontado a muitos.
O aspecto mais desapontador da Presidência de Obama está na sua dificuldades de mobilizar as emoções dos americanos, depois de ter o nome tão associado à esperança e à mudança. Ele não foi tão habilidoso para liderar o público em torno de sua agenda quanto eu imaginava. Para ser honesto, acho que, como para muitas pessoas, minhas expectativas eram altas demais.
Afinal, Obama esteve amarrado a um colapso econômico de uma magnitude que os EUA não experimentavam desde a Grande Depressão, e ele está tentando liderar durante um dos períodos mais desequilibrados da política americana. Acontece que, com seus dons excepcionais em oratória, eu esperava mais discursos memoráveis e poderosos, que pudessem galvanizar não só seus apoiadores, mas a nação como um todo.
A esta altura, é impossível julgar o lugar que Obama ocupa na história. Seu primeiro mandato ainda não está completo e ele pode ou não ganhar um segundo. Mas a infelicidade de ser obrigado a socorrer uma economia muito doente certamente enfraqueceu suas possibilidades de perseguir grandes objetivos.
O mero fato de que os americanos elegeram um presidente negro deu um belo impulso ao sonho de que os EUA sejam menos racistas e - por que não? -, o mundo também. É claro que sua eleição não eliminou o racismo, mas foi um passo na direção do sonho de Martin Luther King, para que julguemos uns aos outros segundo o caráter, não pela cor da pele. Também penso que a eleição de Obama reflete a contínua diversificação dos EUA, em que os brancos estão se tornando uma porcentagem menor da população. Obama é o primeiro de muitos outros não brancos que vão chegar à Presidência.
De todas as críticas à gestão de Obama, a mais genuína é aquela que o considera conciliador demais, ou fraco, como dizem os conservadores. Obama sempre preferiu fazer concessões, na tentativa de atingir ao menos parte de seu objetivo final.
Mas, a meu ver, ele cedeu rápido demais na luta para aprovar a reforma do sistema de saúde. Isso levou a uma versão diluída de sua ideia original, de garantir que todos os americanos tivessem uma cobertura de saúde adequada. De todo modo, ele foi o primeiro presidente a fazer reformas substanciais em um sistema de saúde muito falho, e acho que a história vai lhe dar crédito por isso.
Considerando que o presidente, no fim das contas, não conseguiu resgatar a economia da recessão que começou em 2007, é claro que, se Obama perder a eleição em novembro, a economia americana vai ser a razão."
* David Mendell, jornalista, é autor de "Obama: From Promise to Power" (Amistad, 2008)

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