sábado, 27 de junho de 2020

Um Brasil que não é para inglês ver

Washington Olivetto*
Desde 2016, eu, que adoro Nova York, moro em Londres, cidade que considero a melhor Nova York do mundo. Tudo acontece antes por aqui: do útil ao fútil, sem espaço para o inútil.
Entre o segundo semestre de 2019 e o primeiro semestre de 2020, dois fatos aparentemente opostos e teoricamente irrelevantes me chamaram bastante a atenção nessa panela de pressão cultural que é Londres: uma palestra de Sir Paul Smith, o bilionário designer de moda masculina, e uma entrevista de um ex-editor do jornal The Guardian.
Na sua palestra na Royal Academy of Arts, Paul Smith contou onde buscava inspiração para criar ternos, camisas, paletós, pulôveres e suas mundialmente famosas meias coloridas.
Explicou que desde muito jovem optou por fotografar plantas, flores e pinturas cujas cores e texturas chamassem sua atenção, e com a mistura dessas referências visuais começou a desenhar suas coleções.
Com o passar do tempo, acrescentou nessas pesquisas fotográficas inúmeras viagens, que acabaram gerando desde ternos inspirados nas vestimentas dos berberes —habitantes do deserto de Marrakesh— até meias com as cores dos prédios projetados pela Schmidt Hammer Lassen, estúdio dinamarquês famoso por sua arquitetura de vanguarda.
Já o ex-editor do The Guardian, do qual eu não me lembro o nome porque peguei a entrevista já começada, falando para a televisão inglesa, contou sobre os seus critérios para decidir se uma notícia merecia ou não ser publicada.
Comentou que certas notícias só beneficiam o noticiado e não são interessantes para o jornal —e muito menos para os seus leitores.
Ilustrou o comentário dizendo que se ainda estivesse na ativa, na direção do The Guardian, não publicaria a maioria das notícias que a imprensa inglesa tem publicado sobre o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.
Para o veterano jornalista, o presidente Jair Bolsonaro cria falsos factoides para acobertar graves fatos verdadeiros.
Ofende a esposa de outro estadista, discorda das recomendações de cientistas, ameaça destroçar a atuação proativa do Brasil nas questões de meio ambiente, direitos humanos, povos indígenas e reforma da ordem internacional, e trata com desprezo uma jovem preocupada com a crise climática.
Para aquele jornalista, esses fatos só interessam para o provocador dos fatos e não representam o Brasil que merece ser noticiado. Segundo ele, o Brasil que merece ser noticiado é o Brasil do Tom Jobim, do Ivo Pitanguy e do Oscar Niemeyer.
Assisti, ouvi e concordei.
Eu, que vivo aqui em Londres, em contato com profissionais de comunicação de toda a Europa, diariamente ouço as mesmas duas perguntas: por que o Brasil, que historicamente sempre foi visto como o país da doçura, de repente se transformou no país do amargor? E por que o Brasil não faz algo para melhorar a sua imagem?

Para as duas perguntas, eu tenho uma única resposta. Não adianta fazer publicidade de nenhum produto se esse produto não for bom. E o produto Brasil está precisando melhorar muito antes de ser anunciado.
Quando o produto melhorar, o jeito de anunciar o Brasil não é difícil. Temos, em muitas áreas, talentos enormes, e brasileiros dignos e responsáveis como Tom Jobim, Ivo Pitanguy e Oscar Niemeyer.
Da somatória da imagem de muitas pessoas físicas respeitáveis, podemos construir a imagem da pessoa jurídica Brasil

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