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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

A Selic e os Trens de Alta Velocidade

Osvaldo Campos Magalhães*
Preocupados com a retomada da inflação, que motivou o aumento da taxa SELIC pelo Copom, e, em atingir a meta de superávit primário, a área econômica do governo articulou rapidamente um grande corte no orçamento, cerca de R$ 50 bilhões. Entre as medidas anunciadas, suspensão de concursos públicos, aquisições, reformas e aluguéis de imóveis pela União, auditoria da folha de pessoal e, medida polêmica às vésperas da votação do valor do salário mínimo: bloqueio de R$ 18 bilhões nas emendas parlamentares.
Enquanto isto, o governo ignora completamente as críticas formuladas por consultores especializados a algumas obras faraônicas do PAC, que permanece intocável, conforme anunciado pela própria presidenta Dilma.
A mais emblemática destas obras é a construção de uma ligação ferroviária entre Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro, utilizando a tecnologia dos TAV´s - Trens de Alta Velocidade. O valor estimado da obra é de mais de R$35 bilhões, e, se repetir o ocorrido em outros países, como Coreia, Taiwan e França, não sairá por menos de R$50 bilhões.
Certamente influenciado pelo sucesso da China na implantação da maior rede mundial de linhas TAV, o governo brasileiro tem permanecido impávido frentes às inúmeras críticas em relação ao projeto. Contudo, as condições chinesas são completamente diferentes, pois o país domina a tecnologia dos Trens de Alta Velocidade, possui uma população dezenas de vezes maior que a brasileira e acumula reservas que podem bancar o bilionário projeto.
No Brasil, o projeto do TAV, carecendo de viabilidade econômica e de detalhamento técnico do projeto de engenharia, não atraiu o interesse das cinco grandes empreiteiras brasileiras, repetindo o ocorrido com outro projeto de viabilidade duvidosa, a Usina de Belo Monte, que enfrenta novos questionamentos da área ambiental e do MPF. Tendo adiado o primeiro leilão, para viabilizar o TAV, o governo além dos subsídios já anunciados repete a estratégia utilizada no leilão de Belo Monte, anunciando o envolvimento de empresas estatais como Eletrobrás e Correios.
O projeto do trem-bala brasileiro é um “caso clássico de má qualidade da gestão de investimentos públicos”. Quem afirma é Marcos Mendes, doutor em Economia pela Universidade de São Paulo e consultor legislativo do Senado, que vem se debruçando já há algum tempo na análise do projeto.
No novo estudo divulgado no final de janeiro, Mendes aponta que os desembolsos do governo no trem-bala devem somar investimentos diretos de mais de R$ 3,4 bilhões para a criação da estatal ETAV, que será sócia do empreendimento, um subsídio de mais R$ 5 bilhões a ser concedido pelo Tesouro, caso haja frustração de receitas. Além disso, utilizara mais de R$ 20 bilhões do BNDES, em financiamentos subsidiados.
"O que concluímos é que o governo está bancando um projeto bilionário sem estudar profundamente seus benefícios", critica Mendes.
Enquanto isso, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que vem coordenando os estudos do TAV, se mantém impávida, rebatendo todas as críticas ao projeto. Seu presidente, Bernardo Figueiredo reitera que todas as etapas programadas serão cumpridas até a assinatura do contrato. Se não houver alterações no edital, isso significará que se as concessionárias tiverem dificuldades em saldar a dívida, o BNDES assumirá a gestão do TAV.
Num momento em que a retomada inflacionária ameaça uma das mais importantes promessas da presidenta eleita, a diminuição das taxas de juros, o governo deveria suspender o faraônico projeto, que somente trará benefícios ao parceiro internacional, às empreiteiras envolvidas e, às camadas de alta renda da população, que seriam os usuários do projeto.
O assunto só deveria ser retomado pelo governo quando os estudos de engenharia e de viabilidade econômica permitissem a realização da obra sem qualquer subsídio público.
*Osvaldo Campos Magalhães é Engenheiro, Mestre em Administração e Especialista em Infraestrutura de Transportes.

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