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quinta-feira, 7 de maio de 2015

"Não existe nada que me envolva na Lava Jato", diz Gabrielli

Osvaldo Lyra e Paulo Roberto Sampaio

Tribuna da Bahia - Como o senhor está vendo essas investigações da Operação Lava Jato?
José Sérgio Gabrielli - O objeto da investigação, pra mim, é um objeto que deve ser perseguido, e punido quem cometeu esses crimes. No entanto a operação tem excessos, que começam a ser corrigidos, por exemplo: prisão preventiva muito longa, ameaças familiares, usar a prisão para obter delação premiada. São métodos condenáveis num processo democrático normal e juridicamente correto. O STF está reconhecendo isso na medida em que liberou pessoas presas há muito tempo. É preciso reduzir os excessos. Além do mais existe uma exploração midiática muito grande. Uma investigação desse tipo tem que ser feita com mais sigilo. É uma investigação que, pela simples delação de alguns, você massacra midiaticamente quem é investigado sem sequer ter comprovação. Então há um aproveitamento midiático muito intenso, que é negativo para um processo de investigação mais consistente. E por fim, há uma exploração política e eleitoral da oposição, que está tentando criar com esse fato um clima para generalizar um comportamento individual.

Tribuna - Como vê as delações premiadas feitas por empreiteiros e operadores do esquema de corrupção?
Gabrielli - As delações premiadas devem ser investigadas e provadas. Até agora tem pouca prova elementar que leve à identificação da acusação que foi feita aos empreiteiros principalmente. O que tem sido denunciado pelos empreiteiros, pelo ex-diretor da Petrobras e ex-gerente, o Barusco... é que eles têm dito que existia um esquema de corrupção entre empreiteiros e doleiros e funcionários da Petrobras, que funcionava fora dos registros internos da Petrobras. Tanto isso é verdade que, depois de cinco meses de intensa atividade para publicar o balanço, depois de contratação de dois escritórios para atuar especificamente sobre as denúncias, depois das investigações da PF, do MPF, do conjunto de investigação da imprensa, a Petrobras não consegue identificar exatamente o que aconteceu em termos da corrupção. Tanto é que no balanço passou uma régua geral.  3% de todos os contratos é considerado como potencialmente objeto de corrupção. Mas não há como comprovar que de 2004 a 2012 cada caso e o valor de cada tipo de ação.
Tribuna - Como é possível uma empresa ser lesada em mais de R$6 bilhões e seu presidente não saber de nada?
Gabrielli - Da mesma maneira que todos os investigadores voltados para a denúncia, a auditoria interna, os auditores externos, a PF, o MPF, toda a imprensa não consegue identificar exatamente o que aconteceu e isso depois da denúncia. Como é que durante oito anos você vai identificar isso? É bom lembrar o volume das operações da Petrobras. De 2008 a 2012 a estatal deve ter investido mais de 300 bilhões de dólares, o que equivale a 600 bilhões de reais. Então estamos falando em coisa de 1% desse investimento total. Então, na operação do dia a dia é impossível de perceber esse tipo de questão. Não houve seis bilhões de roubo de uma vez só. A Petrobras tem anos em que tem 300 mil contratos. Não é algo que ocorre num contrato só.

Tribuna - Quem eram seus homens de confiança na empresa e qual a situação deles hoje?

Gabrielli - Eram todos. Trabalhava com toda a Petrobras. Eu era uma pessoa jurídica. Na medida em que eu estava presidente, atuava com o conjunto da empresa. Todas as pessoas ao meu redor. Agora você trabalha com grau de confiança e descentralizando decisões senão não consegue funcionar. E se tem problemas inadequados em alguns, e são muito poucos os delatados, isso é individual e tem que ser punido individualmente.
Tribuna - Renato Duque e Paulo Roberto Costa chegaram com uma missão específica. Como era a sua relação com eles?

Gabrielli - Missão específica você que está dizendo. Eles chegaram lá como diretores. Quando assumi uma diretoria eles já eram... O Renato Duque foi diretor comigo e o Paulo Roberto entrou antes de eu ser presidente. Eles chegaram como diretores e agiram como diretores. Se Paulo Roberto confessa que fez algo inadequado, ele vai responder por isso, não sou eu nem a Petrobras.
Tribuna - Que fim terá o seu partido após tantos casos de corrupção?
Gabrielli - Acho que o PT vai ressurgir dessas operações todas. Tenho participado dos encontros para a preparação do congresso do partido. Esse fim de semana existiram mais de 500 encontros no Brasil, aqui na Bahia vários, participei em Camaçari, sábado em Salvador, sábado em Serrinha novamente, então o partido tá ressurgindo e discutindo. E as questões centrais é que primeiro não há como aceitar o que a imprensa e a oposição tentam dizer, de que o PT é um partido corrupto. Pode ter tido comportamentos inadequados de poucos militantes do partido. No caso do Lava Jato, não  tem nenhum filiado ao PT de fato envolvido com nada. O secretário-geral do PT está sendo acusado, mas está negando. O que se tem é a acusação de um criminoso que já mentiu uma vez e pode estar mentindo novamente.

Tribuna - Como vê as criticas de ex-aliados do PT ao governo, como Carlos Lupi e Marta Suplicy?

Gabrielli - Eles estão tendo motivos políticos específicos. A Marta quer ser candidata a prefeita de São Paulo. Acho uma atitude muito desonesta com a história deles e com o que aconteceu no passado. Tanto o PDT tem uma história de problemas, e é preciso olhar essas histórias, como a Marta não pode dizer que ela foi construída e se tornou politicamente o que é com a expressão que tem dentro do PT. Ela tem que analisar com um pouco mais de distanciamento do que a mídia quer colocar nesse momento. A história mostra que quem surfa na mídia não se dá bem ao longo prazo.
Tribuna - Ate onde o senhor teve interferência na compra da refinaria da Pasadena?

Gabrielli - Tive interferência como presidente e membro do Conselho.  Antes de mais nada, é importante a gente ir para os fatos. A refinaria foi comprada numa estratégia definida em 1998, de buscar capacidade de refino no exterior pela Petrobras, que ia buscar e produzir muito petróleo pesado. E a refinaria, portanto, poderia ser usada para produzir diesel e óleo de aquecimento para o mercado americano. No momento que foi comprada, em 2006, foi uma boa compra. Significava boa estratégia. Há uma falsidade dizer que ela custava – olhando o passado como se comprasse empresa pelo valor do passado – 42 milhões e a Petrobras comprou por 360 milhões a metade dela. É uma acusação falsa, porque primeiro não custou 42 milhões ao sócio anterior. Era uma espécie de leasing, que na indústria se chama de tolling, aluguel da refinaria por um tempo e depois com direito de compra, que a parcela final foi 42 milhões...  a refinaria foi comprada provavelmente em torno de 360 a 380 milhões de dólares pelo sócio que vendeu à Petrobras. Segundo, a Petrobras pagou 360 milhões por 50%, portanto, 100% representa 720 milhões de dólares. Dividido por cem mil barris de capacidade de destilação, isso dá 7,2 mil dólares por capacidade de destilação, por barril. Isso está entre 3,9 mil, que foi o menor preço de todas as transações ocorridas em 2006, e 19 mil que foi a máxima,  valor de transações ocorridas em 2015. Ocorreram 11 transações  com refinarias em 2006. Pasadena foi comprada por 7,2 mil num intervalo de 3,5 mil a 19 mil dólares. Então comprou abaixo da média do valor de mercado. Então, não há como dizer que na compra teve prejuízo. Segundo problema, o voto do ministro José Jorge, do TCU, foi politicamente  motivado, porque ele é um militante do PFL, foi presidente do PFL, foi ministro de FHC, candidato a vice de Alckmin, militante dos partidos de direita.
Tribuna – O caso foi politizado?

Gabrielli – Com certeza sim. Ele (ministro José Jorge) inventou uma história de um prejuízo comparando o valor pago pela Petrobras depois do conflito judicial, com uma planilha de uma consultoria contratada da Petrobras, que fez 27 planilhas e entre essas, ele escolhe uma que custaria 186 milhões de dólares essa refinaria. A 186 milhões de dólares, isso é a metade do menor preço pago por refinaria em 2006, o que significa que não seria possível adquirir uma refinaria por esse valor. É uma hipótese, conjunto de hipótese. Mas os valores variavam entre 94 milhões de dólares a 1 bilhão e 200 milhões. São 27 cenários diferentes. Ele escolhe um. Porque razão? Ele não responde. E não contextualiza. É um voto profundamente equivocado do ponto de vista técnico, politicamente motivado e cheio de inconsistências processuais que eu estou processando, que na minha defesa está se colocando.
Tribuna - Como economista, continua achando um bom negócio a compra da Pasadena?

Gabrielli - Continuo achando que foi um bom negócio naquele momento. Passou por momento de dificuldade a partir da crise internacional de 2008 e com a redução da atividade econômica nos EUA.  Ela volta a ter bons resultados a partir de 2013, porque tem uma segunda mudança importante nos EUA que é a expansão da produção do gás xisto, e a expansão de condensados e óleos leves em grande quantidade que permite que a refinaria seja abastecida por um óleo leve de boa qualidade, e possa utilizar isso de campos do Texas, com baixo custo de transporte.  Viabiliza uma margem bastante significativa e é uma refinaria que tem margem positiva.
Tribuna - O que dizer das críticas da oposição de que o senhor estaria sendo blindado nesse processo para proteger Lula?
Gabrielli - Não tem como ser blindado com toda a imprensa contra. Não há nenhum grande jornal que seja a meu favor. Acredito que os repórteres investigativos tenham acesso aos vazamentos, que devem ser intensos. Não tem como blindar. E a oposição está firme na atuação da CPI. A Operação Lava Jato não tem porque ter simpatia por mim. Estou sendo investigado mas não tem nada que me envolva diretamente. Não é blindagem. Só não existe nada que me envolva na Lava Jato. Tenho apenas essa discussão no TCU, sobre se a decisão da compra da Pasadena foi correta ou não foi correta, e estou sendo julgado por um voto politicamente motivado.
Tribuna – Recentemente o senhor foi alvo de ofensas verbais durante um voo. Continua sendo alvo de agressão em locais públicos?
Gabrielli - Isso ocorreu durante o processo eleitoral. Acredito que agora não. Há uma atitude de raiva do PT, principalmente pelos segmentos da classe média e de quem não votou em Dilma. Um comportamento antidemocrático, mais de ódio do que de racionalidade. 

 Tribuna - Como vê a onda de protestos ocorridos em março e abril, pedindo o fim da corrupção e mudanças na forma de gerir a coisa pública?

Gabrielli - Todo mundo é contra a corrupção e a má gestão dos recursos públicos. Toda vez que essa pauta geral vira a pauta política central, os regimes autoritários e a ditadura se consolidam. Aconteceu com o fascismo na Itália, com o nazismo na Alemanha, tentou se fazer isso com Getúlio em 54, e resultou na morte dele. Tentou se fazer isso contra Juscelino e ele conseguiu vencer, fizeram isso com Jango e veio o golpe militar. E desde 64, portanto, que essa pauta de transformar a corrupção num problema de política...  isso é uma ação de uma oposição que não tem proposta pro país, nem para melhorar a situação do povo brasileiro, e que tenta surfar num sentimento que é generalizado. Então, essa tentativa não vai dar sucesso, o povo brasileiro vai responder adequadamente e já estamos vendo isso. O movimento contra o PL 4330, da terceirização, mostrou um amplo movimento apesar da mídia não cobrir. E foi maior do que os protestos referidos. Estamos vendo o que aconteceu no Paraná. A reação que o governo do PSDB teve contra o movimento legítimo dos professores. Ao invés de estabelecer o diálogo,  foi na base da repressão violenta com 200 feridos em Curitiba. Essa situação vai se alterar e vamos ver o movimento social voltar, o PT voltar a crescer e continuarmos com a manutenção  do mandato de Dilma, constitucionalmente eleita. A oposição só quer duas coisas: Lutar contra Dilma e contra a corrupção. 
Tribuna – A presidente Dilma está envolvida em crises com o Congresso Nacional, com o Petrolão, crises hídrica, energética e de confiança com a população. Ela conseguirá sair desse cenário?

Gabrielli - Acho que sim. A presidente foi legitimamente eleita, tem uma base eleitoral, uma base aliada além do PT bastante ampla, só que hoje essa base é pulverizada e está sem unidade programática. Se o governo começar a fazer algumas propostas além do ajuste fiscal que tem que fazer,  ou seja, evidente que tem que fazer ajuste fiscal, talvez tudo que o governo propõe seja correto, talvez pudéssemos ter algumas medidas, um ajuste fino melhor, mas não podemos ficar só com a pauta do ajuste fiscal. É preciso ficar com uma pauta de avanço daquilo que elegeu a presidente. Que foi a melhoria do sistema educacional, de saúde, de mobilidade, do processo de aumento da renda de quem menos tem. Esse programa foi o que ganhou a eleição. Então, parece que nesses cinco meses não conseguimos tomar iniciativa nessa linha. Mas conseguiremos. No momento que ela retomar isso, as ruas vão voltar a se manifestar e vamos pressionar o Congresso e a oposição vai ficar numa situação de quem tem direito de reclamar, pois teve metade dos votos, mas não ganhou eleição.
Tribuna - Como avalia o começo do governo de Rui?

Gabrielli - O governador tem um problema fiscal bastante significativo. O orçamento que ele está trabalhando é muito apertado, tem recursos de transferência do governo federal na área de mobilidade, acho que ele está caminhando nessa questão de melhorar o problema da mobilidade... Por outro lado, a criação da Secretaria de Desenvolvimento Rural me parece um movimento importante considerando a importância da agricultura familiar na Bahia. O secretário Jerônimo tem hoje conjunto de instrumentos, mas é um governo que está vivendo sobre intensa pressão fiscal.
TB - O PT terá muitas dificuldades em 2016?
Gabrielli - Acho que a eleição neste ano será municipal, portanto os temas serão muito importantes. Um dos problemas que teremos é a questão da dificuldade fiscal dos municípios, e hoje eles têm uma situação que, pela forma de transferência do Fundo de Participação dos Municípios, de ICMS para os municípios, formas de recursos... Estão numa situação complicada. Dois terços dos municípios da Bahia, a prefeitura recebe menos do que a população recebe de bolsa família e de aposentadoria. Só pra você ver o tamanho do problema que na eleição de 2016 vamos enfrentar, independentemente da crise nacional. O desgate que o PT sofreu pela imprensa e no afastamento dos movimentos sociais vão afetar também. Mas o grande problema será a situação do município.
TB - O que Gabrielli tem feito desde que chegou do governo Wagner, além de se defender das interrogações da Lava Jato?
Gabrielli - Eu sou atualmente só um professor aposentado, tenho intensificado minha militância de base, participado de muita discussão no PT. Temos discutido a situação do país, avançado na reformulação de algumas ideias, e ao que se refere a petróleo e gás, no que se refere à Petrobras, intensificado minha defesa pública, e de defesa jurídica no que se refere ao TCU, que é a grande coisa que tenho, basicamente a discussão sobre Pasadena. E estou disposto a discutir. Porque a Tribuna não propõe um debate público entre Gabrielli e Imbassahy? Estou disposto a participar em qualquer lugar que ele queira. Lançado o desafio.

Colaboraram: Fernanda Chagas e Hieros Vasconcelos Rego

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