Fabio Victor*
Um comentário no Twitter publicado por Marina Silva -no qual uma seguidora da presidenciável escreveu: "Como podemos lamentar a morte de uma pessoa que blasfemou contra Deus a vida toda?"- detonou ontem uma batalha na internet.
O caso, embora miúdo, ilustra o potencial de polêmica em torno de Saramago, cuja veemência (convicção para uns, sectarismo para outros) sempre alimentou entusiastas e detratores.
Foi um intelectual de posições políticas e filosóficas inarredáveis, ateu convicto e "comunista hormonal" (definição dele) até a morte.
Desta carga ideológica surgiram as principais controvérsias de sua biografia.
Em 1993, mudou-se para as ilhas Canárias em protesto contra censura do governo português, que impediu "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" de ser inscrito num prêmio da União Europeia.
Por desconstruir dogmas seculares do catolicismo, a obra foi vista como ataque ao "patrimônio dos cristãos".
Saramago foi criticado por toda a vida pela demissão, em 1975, quando foi diretor-adjunto do "Diário de Notícias", de jornalistas que se opunham à linha do veículo, de orientação comunista.
Em assembleia, o escritor votou pela demissão, mas negava ter sido seu mentor.
Em 2002, comparou a ocupação israelense na Palestina ao campo de concentração de Auschwitz. A defesa da causa lhe trouxe acusações de antissemitismo.
Apoiou a Revolução Cubana sem restrições até 2003, quando, após a execução de três dissidentes, escreveu num artigo no jornal "El País": "Até aqui cheguei. De agora em diante, Cuba seguirá o seu caminho, eu fico".
* Jornalista da Folha de São Paulo
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