Guilherme Fiuza*
Carlinhos Cachoeira perdeu a vontade de viver. Está extremamente deprimido, muito chateado mesmo. Quem deu essa notícia triste foi a noiva do “empresário da contravenção". Andressa Cachoeira. A mesma que dois meses atrás dava risadas, dizendo que seu amado conquistara muita gente por ser “uma pessoa encantadora”. Na época, a musa dos caça-níqueis fazia planos para o casamento assim que Cachoeira saísse da prisão. Hoje o casal não parece mais tão feliz. O que mudou, afinal?
Aparentemente, nada. Carlinhos continua preso, Andressa continua linda, e o patrimônio milionário dos Cachoeiras, construído com o suor dos políticos comprados, continua intacto no laranjal da família. O que estará azedando esse conto de fadas do Cerrado? Ao que tudo indica, a culpa é da CPI.
Quando todos os holofotes estavam apontados para a Comissão que investiga as obras completas do bicheiro, estava tudo bem. Com o Brasil inteiro olhando para o escândalo, os clientes de Cachoeira tremiam em seus gabinetes. O risco a seus mandatos e pescoços recomendava um olhar carinhoso para com Carlinhos, garantindo-lhe tratamento republicano com a grife de Márcio Thomaz Bastos, o padroeiro das causas malcheirosas. Era um tempo de otimismo, com governantes e parlamentares suando frio, e a sensação de que a qualquer momento um habeas corpus mágico do doutor Márcio acabaria com aquele constrangimento todo. Como chegou a ponderar Andressa “ninguém está livre de ser preso” - ou seja, era um mero incidente a superar, para o bem de todos (os sócios).
Mas algo deu errado. O Brasil, entediado, mudou de novela. Preferiu os pilantras de Avenida Brasil e os charlatões da Rio+20. Abandonada pelo público, a CPI ficou à vontade para embromar sem culpa. Aliviou o ex-dono da Delta, barrou sua convocação tranquilamente, enquanto a plateia assistia ao teatro da salvação do planeta no Rio de Janeiro. Os depoimentos de Fernando Cavendish e Luiz Antonio Pagot (ex-diretor do Dnit) ficaram para depois das férias, depois das Olimpíadas, depois do início da campanha eleitoral - enfim, ficaram para depois, como se o desfile da Mangueira fosse marcado para Quarta-Feira de Cinzas.
Carlinhos não merecia isso. Com a queda vertiginosa da CPI no ibope, seus companheiros no Congresso e nos palácios descobriram que a farra pode sair mais barata do que parecia. Se o Brasil não está nem aí, eles também não estão. Cachoeira começou a entender que pode mofar onde está. Daqui a pouco o comando da República popular desloca Thomaz Bastos para refrescar outro aloprado, e a jovem Andressa perceberá que ninguém está livre de continuar preso. A essa altura, talvez nem a Playboy a queira mais.
Como rei morto é rei posto, Adriano Aprígio, o ex-cunhado de Carlinhos e um de seus principais testas de ferro, já caiu também. Foram descobertos e-mails enviados de sua casa á procuradora Léa Batista de Oliveira, uma das denunciantes do bicheiro, em tom não muito educado: “Sua vadia, ainda vamos te pegar. Cuidado, você e sua família correm perigo”. A prisão de Aprígio, um dos guardiões do patrimônio dos Cachoeiras, fez Carlinhos passar mal na cadeia, como revelou sua noiva, consternada: “Ele desmaiou. O diretor pegou, levou ele para a sala do diretor. Ele passou muito mal, muito mal mesmo”.
É comovente ver um homem que tanto fez por tanta gente sofrendo assim. Sozinho, com as noticias terríveis que recebe na cadeia. Neste momento de dor, vai aqui um conselho ao torturado réu: nobre empresário da contravenção, pare de esperar pela providência dos falsos companheiros. Acabe você mesmo com a solidão. Agora.
Faça como Roberto Jefferson: aperte o botão vermelho. Conte quem no governo federal mandava proteger a Delta e aprovar todos os acréscimos de contrato que a construtora espetava no PAC. Explique resumidamente como esse dinheiro saía do governo e voltava para as campanhas dos políticos aliados ao governo, passando por suas empresas de fachada.
Acorde, senhor Cachoeira. Seus amigos palacianos vão esquecê-lo nesse cubículo. Seus esquemas serão refeitos com outro despachante mais esperto. Entregue esses parasitas com crachás de revolucionários. O Brasil lhe será eternamente grato.
* Guilherme Fiuza é jornalista. Publicou livros Meu nome não é Johnny, que deu origem ao filme 3.000 dias no bunker e Amazônia, 20º andar.
gfiuza@edglobo.com.br
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