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quinta-feira, 13 de abril de 2023

100 dias de governo Lula: balanço positivo e sinais de alerta


Miriam Leitão*

Novo governo avançou em muitas áreas, mas há muitas correções a fazer e repetições de erros a evitar

Nesses 100 dias, o governo do Brasil voltou a defender a vida dos indígenas, a combater o racismo, a impedir a boiada de passar sobre o meio ambiente. O Brasil voltou a se conectar com o mundo através da diplomacia presidencial e das novas orientações que chegam aos diplomatas. Houve ruídos, palavras fora do lugar, movimentos preocupantes e erros.

 Programas que haviam sido distorcidos ou abolidos foram recuperados e relançados. Isso não é pouco. A volta do Bolsa Família não foi uma troca de nome, foi a opção por reconstruir as bases de uma política pública exitosa e que tem critérios e propósitos.

O balanço dos 100 dias, para ser justo, tem que começar do ponto do qual este governo pegou a administração pública. Foram, em muitas áreas, quatro anos de pura demolição institucional. “Cupinização”, para usar a expressão da ministra Cármen Lúcia. No meio ambiente foi constante e implacável o ataque do governo Bolsonaro ao patrimônio natural do Brasil. Relançar o PPCDAm, o plano que foi um novo arcabouço na luta contra o desmatamento, e que teve um sucesso incontestável, não será apenas a reciclagem de um programa. Reconstruir as bases bombardeadas das políticas públicas não é trivial, principalmente quando tudo ficou mais difícil pelo avanço do crime.

Foram muitos os erros também. A lei das estatais blindava as empresas públicas do nefasto loteamento político. Há pontos muito rígidos na lei. Mas o governo Lula não quer apenas corrigir pontos, ele quer revogar a legislação. Na área dos preços dos combustíveis todos os sinais são de que o PT quer cometer erros velhos. 

O BNDES tem falado em taxas de juros mais baixas para inovação e transição ecológica. Entende-se que certas atividades não possam ser financiadas a este custo do dinheiro. Mas o ideal é que o banco explique o que quer fazer, de onde sairá o funding, e que critérios serão usados para se definir quem é elegível para o crédito mais barato. 

A Selic está alta sim, mas Lula tem que propor o que ele quer fazer em vez de ficar insinuando que vai mudar a meta de inflação ou propor o fim da autonomia.

Na área institucional, o caminho também está sendo de reconstrução. Cada órgão voltando a se encontrar com a sua missão. E isso é um alívio. Mas o presidente Lula já avisou que na escolha do procurador geral da República usará critérios outros que não a lista tríplice. O Brasil já viu no governo Bolsonaro o risco de ter um PGR subserviente ao presidente da República.

Na escolha de ministros do Supremo não será seguido o caminho que deu certo nas administrações anteriores do PT, com algumas exceções conhecidas. O advogado Cristiano Zanin tem inúmeras qualidades, e foi um combatente na defesa do seu cliente. Mas, por ser advogado pessoal do presidente, não deveria ser ele o escolhido. Não é por gratidão que se escolhe ministros do STF. Bolsonaro costumava falar dos “meus” ministros, os “meus 20%”. Seria terrível ver de novo o pronome possessivo em relação a magistrados que deveriam ter lealdade apenas à Constituição.

Na área econômica, o ministro Fernando Haddad tem acertado muito. Definiu um pacote inicial para começar a pôr ordem nas contas públicas, estabeleceu como meta reduzir fortemente o déficit de R$ 230 bilhões que recebeu, tem trabalhado em coordenação com outros ministros, como Simone Tebet. Tem sobrevivido ao fogo amigo do PT. Negociou um novo limite de despesas e o apresentou. Tem mirado como fonte de arrecadação as brechas da legislação tributária que beneficiam os que têm mais poder e dinheiro. Quanto ele conseguirá avançar nessa agenda depende de um trabalho constante, mas até aqui tem acertado.

O balanço dos 100 dias é positivo. Entre falhas, erros, acertos e resgates prevaleceu um novo clima de mais civilidade que o país passou a viver. Não é pouco. Fomos fundo demais no retrocesso, carregamos ainda as sequelas de um pesadelo. Corremos riscos concretos de erosão de conquistas que custaram caro a gerações de brasileiros.

Os governos podem ser ruins ou bons, podem acertar e errar, pode-se gostar do governante ou não. Isso é vida que segue. Na democracia é assim mesmo. O que não é tolerável é perder a democracia e ver os ataques constantes aos valores fundamentais da civilização. 

O dia em que Lula desembarcou com ministros e com o socorro do Estado aos Yanomami foi o momento em que o Brasil começou a voltar ao caminho que deve seguir.

*Jornalista e escritora

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