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sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Wood Allen, o cruel

Bruno Yutaka Saito
A rotina do dia a dia chega a ser desgastante em vários momentos, quando tudo é repetição e nada é criação, mas alguns rituais, algumas tradições, são bem-vindas. Sou da turma que espera ansioso pelos encontros com a família no Natal e no Ano Novo, por exemplo.
Todos os anos temos o Imposto de Renda. Carnaval. Show do Roberto Carlos. E filme do Woody Allen _nem todos os anos, mas ao menos essa é a impressão.
Um pouco por essa questão de rotina é que coloco Woody em categoria além do mundo cultural. Seus filmes são referências que ajudam os cinéfilos a se situar no tempo. Para mim, são filmes-coisa. Já sabemos do que se trata, mas, como um perito, nos deliciamos com as pequenas sutilezas e peculiaridades de “coisa” em “coisa”.
Todos os anos esperamos pelo novo filme de Woody. Já sabemos de antemão que alguns personagens vão se repetir. O sujeito meio atrapalhado que vai trair a mulher. Ou então o sujeito que comete algum infração e tenta ocultar seu crime. A mulher linda, mas meio tola, que irá inicialmente fazer um homem subir às alturas, mas que depois irá se mostrar um estorvo. O neurótico, paranoico, inseguro.
Tudo isso está em “Você Vai Conhecer os Homens dos Seus Sonhos”. Mas, ao mesmo tempo, há um gosto amargo.
São basicamente dois casais e suas infidelidades. Após anos de casamento, Alfie (Anthony Hopkins) se separa de Helena (Gemma Jones). Esta irá se consolar com uma vidente charlatã. Ele irá se casar com uma prostituta.
Sally (Naomi Watts), filha do casal, não está em situação melhor. Ela é casada com um pretendente a escritor, Roy (Josh Brolin), que está de olho na vizinha. Já Sally está de olho no chefe.
A questão de acaso e destino, ou a nossa impotência em relação ao desenrolar dos acontecimentos, está totalmente atrelado à construção da personagem de Helena.
Na sessão em que eu estava, ouvi poucas risadas. Este filme teoricamente é uma comédia, mas ela é sombria. Cruel demais com seus personagens. Woody nunca foi santo com eles, mas aqui ele é sádico, como podemos ver numa das cenas finais, entre Sally e Helena.
Esse tom estranho vem, em grande parte, da escolha do elenco, em especial Anthony Hopkins e Josh Brolin. Hopkins é um Hannibal Lecter adaptado ao universo de Woody.
Canibal em outro sentido, mas ainda canibal e frio. Já Brolin encarna parte daquela “reserva de mercado” de alter ego “alleniano”. É inseguro, infiel, desesperado. Mas não é engraçado. Brolin parece estar se especializando em personagens com caráter duvidoso, difícil de criar empatia com o público, como em “W” ou “Wall Street 2” _não que isso signifique ser um mau ator; pelo contrário.
“Você Vai Conhecer os Homens dos Seus Sonhos” está longe de ser ruim. Mas a sensação é estranha, como se, neste ano, a tradição da repetição tivesse sido pervertida.

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