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terça-feira, 10 de maio de 2011

Fiesp e UFRJ divergem sobre papel da China na economia mundial

Debate sobre alternativas estratégicas entre Brasil e China, na Fiesp, registra opiniões diferentes
O presidente do Cosec/Fiesp, Delfim Netto (esq.), e o professor da UFRJ, Antônio Barros de Castros, na Fiesp
Solange Sólon Borges*
O Brasil gira na órbita asiática, incluindo a sua indústria, pois o modelo chinês impôs grave ruptura na economia mundial. A avaliação foi feita por Antônio Barros de Castro, professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e presidente do Conselho do Instituto Brasil-China (Ibrac). Castro integrou, nesta segunda-feira (9), a reunião do Conselho Superior de Economia (Cosec) a fim de debater alternativas estratégicas na relação entre os dois países.
Para o professor, a atual estrutura da indústria na maioria dos países se condicionou, em alguma medida, à China. Enquanto muitos já tomaram consciência desse processo e reagem, “o Brasil se mantém um pouco à margem, pois a China esteve presente primeiro em outros mercados e chegou depois aqui, mas de forma abrupta”, avaliou. E prosseguiu: “Nesse momento no qual o País retoma seu crescimento, após 25 anos de estagnação, o problema será 'como' fazer isso, ao redirecionar os rumos da indústria e se adaptar a esse mundo sinocêntrico”.
O presidente do Cosec, Delfim Netto, levantou um ponto de vista divergente: “O que o Brasil quer ser [no futuro] não pode se subordinar ao que a China está decidindo ser agora. O mundo não condicionará o seu crescimento em função da China, mas esta é que terá de se adaptar à economia mundial”.
Para o ex-ministro, um dos pontos estratégicos é o País ter a capacidade de pensar sobre si mesmo a fim de aproveitar suas reais oportunidades. Delfim Netto citou o setor automobilístico brasileiro, que foi capaz de desenvolver carros 100% nacionais, tecnologia própria, além de outras vantagens competitivas, como o Pró-Álcool.
Antônio Barros de Castro retratou a área automobilística chinesa: 85% da produção resultam de empresas que mantêm acordos com todas as multinacionais, somando quase 18 milhões de unidades/ano, número similar à produção brasileira. O professor citou como exemplo a Chery, que fabrica o veículo QQ, comercializado na China a US$ 8 mil e, no Brasil, a R$ 22 mil, ou seja, preços populares “arrebentando mercados”, em sua avaliação.
Uma nota só
A China fez a opção de produção segmentada e pratica novidades organizacionais com a criação de polos produtores de um só bem, constituindo clusters gigantescos ligados a municipalidades, segundo explicou o presidente do Ibrac. Ele lembrou que aproximadamente 90% do sistema produtivo se dão de forma privada e as multinacionais, quando ali desembarcam, são obrigadas a se associar a um investidor local.
Castro exemplificou que uma única cidade chinesa é capaz de responder por 70% dos isqueiros fabricados mundialmente, o que leva à obtenção de custos e preços jamais alcançados. Há outros movimentos registrados no campo das telecomunicações e de equipamentos médicos, que não se traduzem em tecnologias alternativas e inovadoras, mas sim na miniaturização e redução drástica dos valores dos aparelhos em uso.
Em função desses novos processos organizacionais, de logística, distribuição e estratégias de inserção que a China se diferencia, somando mais de duzentos acordos de cooperação internacional, conforme enfatizou o professor da UFRJ.
*Jornalista da Agência Indusnet Fiesp

A China cada vez mais próxima
Renato Pompeu*
Está para fazer trinta anos que, em dezembro de 1978, dois anos depois da morte de Mao Zedong, à qual se seguiram a condenação da Gangue dos Quatro, que comandara a malfadada, violenta e ineficaz Revolução Cultural, e um expurgo de "desviacionistas de esquerda" do partido e do Estado, a Terceira Reunião Plenária do 11º Comitê Central do Partido Comunista da China, sob a então nova liderança de Deng Xiaoping, decretou o fim do maoísmo como bandeira política e econômica, e o manteve apenas como bandeira ideológica do regime chinês, segundo artigo do pesquisador americano Gregory Albo publicado na revista Socialist Project. Foi então iniciado um esboço muito precário de abertura política, com a condenação da "luta de classes em escala de massa", mas principalmente foi introduzido o "trabalho do partido pela modernização socialista", ou seja, a combinação do "ajuste pelo plano" com o "ajuste pelo mercado". As empresas estatais e as comunas agrícolas adotaram práticas de mercado, como a demissão por falta de rentabilidade e o estabelecimento de preços segundo a fórmula custos mais lucro. A partir de 1979, foram criadas zonas econômicas especiais, em que passaram a vigorar práticas plenamente capitalistas, com empresas privadas e capitais estrangeiros, que aproveitaram os baixos salários vigentes na China, para se desenvolverem rapidamente. Essas zonas eram situadas perto de Hong Kong e Taiwan, para atrair mais facilmente seus capitais. Tudo isso deveria ocorrer sem maior liberalização política e sempre sob o comando do Partido Comunista. As fórmulas de liberalização econômica e autoritarismo político se mantêm até hoje, com um crescimento econômico de continuidade ininterrupta, em proporção sem paralelo nos países plenamente capitalistas, não se sabendo se esse caráter contínuo se deve exclusivamente à extrema liberalização econômica nos setores industrial, comercial e de serviços, inclusive nas empresas estatais (que concorrem entre si), liberalização que permitiu um dinamismo excepcional à economia chinesa durante décadas, ou se se deve em alguma parte, como argumenta a própria liderança chinesa, ao controle exercido pelo domínio do Estado nos setores energético e, principalmente, bancário – as crises de energia não foram totalmente evitadas, mas as crises financeiras, até agora, sim. É isso que a liderança chinesa chama de "socialismo de mercado", a rigor só diferente, como dizem muitos especialistas, do capitalismo com empresas estatais de grande porte vigente na Grã-Bretanha entre a Segunda Guerra Mundial e o governo Thatcher, pela extrema precariedade da situação dos trabalhadores na China.
O grande problema é que há uma grande contradição entre a liberalização econômica e o autoritarismo político. O fato é que, economicamente, a China está cada vez mais próxima do Ocidente – politicamente ainda está presa ao seu milenar estatismo, que é muito anterior à tomada do poder pelos comunistas. Se, porém, como diz a própria doutrina oficial na China, o marxismo, os fatores econômicos sempre são mais decisivos do que os fatores políticos, não é demais esperar que, nas próximas décadas, a liberalização política torne a China ainda mais próxima dos países ocidentais. Afinal, desde a liberalização econômica de 1978, houve um forte movimento pela democracia, só esmagado pelo massacre da Praça da Paz Celestial em 1989 – e não é segredo que as novas gerações de chineses estão insatisfeitas com as condições políticas atuais.

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