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sexta-feira, 15 de julho de 2011

A Flip e o resto do Brasil

Jorge Portugal*
Passei cinco dias na FLIP gravando matérias e entrevistas para o programa Aprovado! aqui da Bahia. Mais do que isso, também curti a FLIP, suas mesas, as palestras, os debates, aquela overdose de cultura de alto repertório. Vi, com olhos marejados, o depoimento do Mestre Antonio Candido, na abertura do evento e, na sequência, a prosa poético-solar de Zé Miguel Wisnik, sempre brilhante, talento que nunca tira férias. O duelo de titãs entre o ceticismo filosófico de Luiz Felipe Pondé e o humanismo científico de Miguel Nicolelis nos deu a certeza de que o Brasil nada deve ao pensamento avançado do mundo.
Vi também Inácio de Loyola Brandão e Contardo Caligaris transformarem um fim de tarde em Paraty num belo thriller de narrativas memoráveis e assisti, por fim, a João Ubaldo Ribeiro, pop star absoluto da grande literatura da Ilha Brasil. Só para ficar nos nacionais. Trinta mil pessoas aplaudiam, com entusiasmo, intervenções, leituras, citações, tudo que fosse palavra boa de quem sabe fazer a mais fina arte com as palavras. Cheguei a fazer uma boutade com João Ubaldo, sugerindo uma letra de lei em nossa constituição que determinasse o direito (e o dever) a todas as cidades brasileiras realizarem uma FLIP. Naqueles dias, Paraty foi a capital da inteligência brasileira, uma espécie de centro irradiador de poesia, beleza e grandes ideias.
Mas aí, "aquele demônio inquieto" que mora no coração do educador começa a se coçar e a sonhar com coisas não recomendáveis a quem deseja paz de espírito. Por exemplo: Por que essa maravilha SÓ para 30.000 pessoas? Tudo bem, a internet transmitiu em tempo real, mas o contato direto, a fricção, o encontro com as super figuras que lá estiveram foram privilégio de poucos. Paraty é cidade cara, e fica mais cara ainda nessas ocasiões...
De novo, o "demônio": e por que não "espalhar" Paraty por mais dias do ano? Trazer um pouco do "conteúdo Paraty" e colocá-lo no currículo das escolas - públicas e particulares -, baratear o custo dos livros, criar uma "Faixa Flip" na programação das tevês comerciais, começar a fazer tudo isso tornar-se familiar ao brasileiro médio, quem sabe despertar um gosto escondido que nunca veio à luz por falta de estímulo e conhecimento. Utopia?
Pois asseguro-lhes que, guardadas as proporções, eu tive minha Paraty ainda no Ginásio Teodoro Sampaio, em Santo Amaro, quando vivia entre os 12 e 15 anos. Era a SELIBA/SA - semana do livro baiano, organizada pelo educador Hermano Gouveia, que promovia um contato direto entre os grandes escritores do estado com os estudantes, em uma semana inteira de música, teatro, literatura e poesia. E dali saiu tanta gente boa para as letras e para a vida.
Paratys escolares, que tal? Para que o resto do Brasil também possa "comer do biscoito fino" da literatura e das ideias, como queria Oswald de Andrade, o homenageado da FLIP deste ano.
Com a palavra o MEC e as secretarias de educação. E cultura.
*Jorge Portugal é educador, poeta e apresentador de TV.
** Artigo originalmente publicado no site Terra Magazine

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