Nesse ponto, era esperado, por sua formação internacional e multiétnica, que entendesse melhor o mundo que seu antecessor. E foi o caso. Obama reconstruiu a reputação dos EUA em grande parte do mundo. Nunca foi realista esperar que um presidente dos EUA, no contexto global atual, voltasse atrás na 'Guerra ao Terror'. Seus gestos na direção de acordos nucleares com a Rússia são interessantes, e a forma como ele lida com a ascensão da China é precisa, apesar do desejo dos republicanos de que faça um passe de mágica e interrompa o avanço chinês.
Obama foi levado ao poder por sua imagem progressista, associada à promessa de mudança e esperança. Mas a fábrica de salsichas que é o processo político nos EUA limita qualquer presidente. Por causa das expectativas enormes em torno de Obama, o senso de desilusão foi particularmente forte. Soluções de compromisso são uma parte essencial do sistema político americano, mas talvez ele tenha cedido demais a uma oposição determinada a destruir seu mandato. Mas o objetivo subjacente de criar coalizões em torno de políticas abrangentes não foi ruim.
Obama tornou-se uma figura histórica, como primeiro presidente negro e um dos mais jovens da história, beneficiário da estratégia de campanha presidencial mais bem-sucedida em muitas décadas. Sua eleição era improvável e extremamente importante. Mas a realidade sempre tira o brilho das expectativas. Portanto, a promessa não ficou intocada, mas segue viva.
A esperança de que a eleição de Obama tornasse os EUA menos racistas deu alguns frutos. É claro que o abismo racial ainda está presente, com diferenças gritantes de oportunidade, expectativa de vida e assim por diante. Ainda assim, em muitos aspectos houve mudanças incrementais. Há 20 anos, seria difícil imaginar um negro na Presidência. Obama estilhaçou o teto de vidro. Isso já é uma grande transformação. Mas a recessão e o colapso habitacional afetaram latinos e negros desproporcionalmente, destruindo décadas de riqueza e ativos acumulados, aumentando massivamente o desemprego e a pobreza. Isso vai entrar em qualquer discussão das relações de raça nos EUA no século XXI.
A crítica segundo a qual Obama é conciliador demais é válida. Num mundo racional, a estratégia teria funcionado: junte gente de boa-fé em volta da mesa, lapide as diferenças e crie políticas que beneficiem a população. Neste mundo partidarizado, onde a política de curto prazo esmaga a boa política, a ideia só permitiu aos republicanos estigmatizar seus projetos e chegar a alturas linguísticas: pintar Obama como um liberal 'taxe e gaste', fazer tudo para obstruir seu governo. Isso ficou mais visível no ano passado, com a crise do teto de endividamento. Naquele momento, Obama deveria ter levado o caso à população. Como não o fez, a estratégia de conciliar a qualquer custo acabou levando ao acordo que só tratava de massivos cortes de gastos.
As críticas que Obama recebe da direita demonstram como sua campanha catalisou um tremendo desconforto cultural na parcela conservadora do eleitorado. Em particular, entre eleitores rurais, brancos e idosos. Muito da oposição acabou sendo extraordinariamente irracional e cáustica. Interesses corporativos, que se preocupam sobretudo com política econômica, impostos e regulação tiraram vantagem disso, mas o fato é que essa oposição abriu o caminho para um movimento que transcende a economia. Parece que estamos passando por algo como um ponto de inflexão nos EUA. Se a oposição mais radical vencer, vamos entrar num período peculiarmente irracional.
O presidente não conseguiu resgatar a economia completamente da crise. Ele interrompeu a queda livre, mas é difícil explicar ao eleitorado que 'sim, as coisas estão ruins; sim, você ainda está inseguro quanto aos empregos; sim, a renda da sua família e a riqueza líquida caíram... mas teria sido bem pior, não fosse por mim'. Não é exatamente o tipo de mensagem de que os sonhos são feitos, mas é com ela que ele vai ter de lutar nessa eleição. Isso tem impacto na qualidade de sua campanha e na disposição da militância para se energizar. Ou seja, se ele conquistar a reeleição, vai ser com uma estratégia mais tradicional: recorrendo aos grandes doadores de dinheiro, publicando anúncios negativos etc."
Sasha Abramsky, autor de "Inside Obama's Brain" (Portfolio, 2009)
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