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quinta-feira, 2 de maio de 2013

Projeto em Pecém revela fraqueza dos estudos ambientais


André Borges | Valor de Brasília


Jarbas Oliveira/Valor / Jarbas Oliveira/ValorA Secretaria de Infraestrutura do Ceará enviou novos dados sobre o projeto de expansão do porto do Pecém ao Ibama
Os alegados atrasos para obtenção de licenças ambientais viraram desculpa para tudo. Das principais obras públicas aos maiores empreendimentos privados em andamento no país, a resposta fácil para justificar problemas com cronogramas sempre carrega, em maior ou menor grau, críticas sobre o roteiro penoso que é imposto pelos órgãos ligados ao licenciamento. Essa tese fica absolutamente enfraquecida quando observados mais de perto casos como o do milionário projeto de ampliação do porto de Pecém, no Ceará.
Pecém não é um porto qualquer. Localizado a 65 km de Fortaleza, no município de São Gonçalo do Amarante, está entre os portos mais promissores do país. Fechou 2012 com uma movimentação total de 4,1 milhões de toneladas, mas tem a pretensão de chegar a 2020 com nada menos que 60 milhões de toneladas. Para isso, é preciso erguer "projetos estruturantes". O problema começa quando se verifica a qualidade dos estudos ambientais que a Secretaria de Infraestrutura do Estado do Ceará (Seinfra), responsável pelas obras em Pecém, submeteu ao crivo do Ibama para tocar esses projetos.
Valor teve acesso a um parecer que analistas ambientais do instituto concluíram no dia 12 de março, sobre o projeto de ampliação do "terminal de múltiplo uso do porto do Pecém" (Tmut), obra avaliada em R$ 568 milhões e fundamental para transformar o porto no quinto maior do país, como ambiciona a Seinfra.
A lista de problemas é grande. Para alimentar o estudo, informações foram simplesmente sacadas de relatórios anteriores, sem que nenhuma menção fosse feita a esses levantamentos. Há dados, por exemplo, que foram extraídos do estudo de impacto ambiental do complexo de Pecém realizado em 2009. Várias informações também foram copiadas do relatório de controle ambiental do terminal de gás natural de Pecém, feito em 2007.
Em diversas partes do estudo, são mencionados impactos sobre a instalação e a operação do complexo industrial e portuário de Pecém (CIPP). Acontece que, como apontam os analistas, esse complexo já existe, está localizado em terra, próximo ao terminal, e não tem nenhuma relação do com o licenciamento solicitado. O estudo chega a utilizar imagens de pessoas entrevistadas durante o antigo estudo do complexo portuário, sem citar essa fonte.
A decisão de usar informações de outros relatórios não é uma prática irregular, apontam os analistas do Ibama, desde que esses dados sejam atualizados e tenham citação de fonte e autoria. "A forma como o estudo foi apresentado trouxe dificuldades à análise, uma vez que muitos dos dados apresentados não indicam a fonte e a data em que foram obtidos e há momentos em que dados secundários são apresentados aparentando serem dados primários (coletados diretamente pelo novo estudo), sem a devida identificação e contextualização", dizem os analistas.
A lista de falhas inclui ações necessárias para a ampliação do terminal, um pacote de obras que inclui a construção de uma ponte com extensão de 1.520 metros, cais de atracação para dois berços, alargamento do quebra-mar do porto e ampliação de seu pátio (retroárea). Em determinado ponto do relatório, justifica-se que essa ampliação não contempla atividades de dragagem (retirada de sedimentos do fundo do mar) e que, por essa razão, não seria necessária a apresentação de um "plano de dragagem". Mais adiante, porém, o estudo menciona que serão movimentados nada menos que 1,792 milhão de metros cúbicos de sedimentos. Não é dito como esse material será retirado, nem mesmo que área será dragada.
Sob a ótica da logística, o estudo indica que o número atual de movimentação de caminhões - em média, 650 veículos por dia - poderá chegar a 900 caminhões por dia (um aumento de 38%), mas não há, como constata o Ibama, nenhuma informação sobre a infraestrutura das estradas utilizadas, nem mesmo apontamento sobre as condições de uso.
Os erros com a base de dados utilizada também envolvem o comportamento marítimo. Os analistas apontam que as tabelas e gráficos de ondas gerados baseiam-se em dados antigos, medidos entre 1995 e 2001, sem qualquer texto que discuta suas implicações. O Porto de Pecém produz relatórios anuais de ondas e correntes. Há dados recentes que poderiam ter sido utilizados.
"Especificamente em relação à avaliação de impactos ambientais, o estudo deve ser submetido a uma reformulação completa", concluem os analistas do Ibama. "Há diversas lacunas de dados importantes e falta de análise da maior parte dos dados apresentados no estudo ambiental."
A empresa de consultoria que a Seinfra contratou para elaborar os estudos de ampliação de Pecém é a Proema Projetos de Engenharia Econômica e Meio Ambiente, que tem sede em Fortaleza. O Valor procurou a empresa e encaminhou perguntas sobre os problemas apontados pelo Ibama. A Proema não se manifestou sobre assunto até o fechamento desta edição. Por meio de nota, a Seinfra se limitou a informar que "o governo do Estado do Ceará já tomou todas as providências no sentido de sanar os questionamentos" do Ibama, "com vistas a obtenção de licença ambiental para a ampliação do porto do Pecém". A secretaria informou ainda que contratou "uma assessoria especializada para formatar estudos complementares que já foram consolidados e enviados ao Instituto, que deve se pronunciar em breve". A Seinfra não divulgou o nome dessa assessoria.
Procurado pelo Valor, o Ibama informou que, no dia 15 de abril, recebeu da Seinfra as complementações e correções do estudo sobre a ampliação do porto e que a previsão é concluir um novo parecer sobre o empreendimento até o dia 10 de maio.

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